Familiares apresentam o acervo do famoso colecionador Catarinense, falecido em 2014
A família Skalee reuniu amigos na noite de 15 de abril de 2016 para apresentar a Coleção RNS (Rubi Nelson Skalee) – um espaço especialmente criado para abrigar uma grande coleção de carros antigos — em Videira – SC — e celebrar seu saudoso idealizador. No local está uma parte dos veículos que ele reuniu ao longo de décadas e que agora é preservada e gerida pelos filhos.
Logo na entrada, uma placa entalhada em madeira com a assinatura de Rubi indica: o que será visto a seguir, é a legítima obra de uma paixão, que foi cultivada com muita determinação. Não se trata de um museu, mas de o santuário de relíquias preservadas e recuperadas ao longo de muitos anos e que ali se perpetuarão para as novas gerações.
A seguir, reportagem que fiz com Skalee anos atrás, para o jornal A Notícia – e que está preservada e emoldurada entre a coleção.
Mais do que entrar num túnel do tempo, apreciar a coleção de carros antigos do empresário Rubi Skalee (em memória) é presenciar a evolução mecânica dos automóveis, desde os primórdios da sua fabricação em linha, no início do século passado. E foi para entender essa miscelânea criativa que ele se transformou num antigomobilista – aquele que tem por hobby colecionar, restaurar e preservar carros antigos.
A curiosidade é, para muitos colecionadores, a mola propulsora que toma para si a dedicação de valorizar automóveis que marcaram época, implantaram novos conceitos e quebraram paradigmas sobre quatro rodas. “Eu queria saber como aconteciam as mudanças nos motores, nas transmissões, em tudo. Por isso comecei a colecionar os carros e prestar atenção em cada modelo, em cada detalhe”, conta o colecionador.
Há 30 anos Skalee garimpa carros antigos, onde quer que vá. Em média, compra dois carros por ano. A grande maioria deles precisa de restauração. Como as peças destes automóveis são difíceis de conseguir, é preciso ter os contatos certos em diferentes partes do mundo.
Como todo colecionador que se preza, ele tem um Ford T 1925 preto, com rodas de madeira. Preservar um veículo assim é uma arte. Nas rodas, por exemplo, foram necessárias doses de veneno para manter os cupins longe. O carro funciona perfeitamente, mas dirigi-lo é mais complicado principalmente por causa das trocas de marcha, que são feitas nos pedais, sem interferência de alavancas.
No total Rubi tem 45 carros na sua coleção. São modelos variados, indo do Unimog 1957, um utilitário 4X4 da Mercedes Benz, até o Honda N360 1971, com 800 cilindradas de potência. Só não funcionam aqueles que estão em fase de restauração. A busca pela originalidade, neste processo, é indispensável.
Destaques dos classificados
O BMW Isetta, com capacidade para duas pessoas, parece realmente um brinquedo grande. “Consegui restaurar todo o veículo em três anos de trabalho”, explica ele. Dos vidros aos pneus, tudo foi cuidadosamente escolhido para que o carro ficasse o mais original possível. Com motor BMW de 200 cc, o carro recuperado por Skalee recebeu duas cores na sua lataria – verde e branco – que lembram a época. Tudo lhe é muito peculiar, seja o tamanho minúsculo ou a porta que está na frente do carro e abre para cima.
UM SONHO DE INFÂNCIA
Desde criança, Rubi Skalee sempre prestou muita atenção aos veículos. Ele queria saber como as coisas funcionavam e viu na evolução dos carros uma forma de compreender melhor os princípios mecânicos que fazem as quatro rodas se mover. Seu primeiro carro antigo, comprado em 1975, foi um Ford A 1929. Na época, o veículo ainda andava e mantinha muitas características originais, mas elas não foram suficientes para lhe garantir uma restauração plena. Por isso, Skalee o transformou numa espécie de bólido de corrida de época. Num exemplo prático, o colecionador diz ter pago o equivalente a 1/20 do valor de um veículo novo, pela raridade.
O Ford 1929 foi o pontapé inicial para a coleção. “Todos os anos compro um ou dois carros. O meu grande objetivo é preservar a evolução que estes veículos traziam, seus conceitos e inovações. Com raras exceções, tudo pode ser recuperado com paciência, dedicação e uma boa dose de investimento”, explicava ele.
Oficinas especializadas neste tipo de trabalho se proliferam em todo o País, assim como as revendas de carros usados, que têm feito o trabalho de garimpo e levado para o mercado verdadeiras raridades. “Muitas peças vêm de outros países. Com o tempo a gente descobre os caminhos certos e consegue muita coisa”, enfatiza.
Acompanhamento constante e paciência são fundamentais para o processo de restauração, que pode durar anos. “Não pode ser ansioso neste tipo de tarefa. Um automóvel antigo, todo reformado, é um objeto único, um objeto de arte”. Não existe tabela de preços para veículos antigos – o valor é baseado em fatores como seu estado de conservação, sua disponibilidade de mercado e seu contexto histórico.
Não basta ter carros bonitos, recuperados e em estado de novo. A manutenção dos veículos requer cuidados especiais, que vão desde uma cobertura com capa simples para escapar do pó, até atenção especial com motor e transmissão. Skalee mantém um galpão de dois andares com suas raridades. As peças de reposição são adquiridas em lojas especializadas e em eventos de carros antigos, onde se pode encontrar de tudo um pouco.
KARMANN GHIA, O PREFERIDO
De todos os carros da sua coleção, Skalee tem no Karmann Ghia sua predileção maior. A resistente mecânica alemã – uma vez que a base mecânica era a mesma do Fusca – através do motor 1200 cc de 36 cavalos, somada ao inédito e belo estilo da italiana Ghia, fez com que logo no seu primeiro ano de produção o modelo vendesse mais de 10.000 unidades.
Além dele, o colecionador divide o coração com o SP2, um modelo da Volkswagen que foi projetado no Brasil. Conta a história que o modelo foi um desejo pessoal do presidente da empresa, Rudolf Leiding, que mais tarde comandaria a matriz. A filial brasileira estava confiante para desenvolver modelos próprios, dos quais a Brasília viria ser um grande sucesso.
Com um desenho bastante arrojado, o primeiro SP tinha parco desempenho devido a seu motor 1.6, que desenvolvia apenas 65 cavalos e o levava a 150 km/h. A segunda versão, batizada de SP2, que Skalee tem na sua coleção, possui motor 1.7 litro de quatro cilindros horizontais opostos, refrigerado a ar, gerando 75 cavalos de potência.
NACIONAIS E MOTOS NA COLEÇÃO
Dentre os veículos nacionais colecionados por Skalle, estão um VW 1600 (apelidado de “Fusca de 4 Portas” e de “Zé do Caixão”) e uma Brasília 1979. Um dos Fuscas é 1986, pertencente aos últimos exemplares da primeira fase de produção deste verdadeiro sucesso automotivo, chamada de Última Série. Com 60 quilômetros no marcador, o carro ainda guarda no seu interior o cheirinho de novo.
O outro é um 1968 bege, com placas pretas. O “Fusca 4 portas” é bastante raro. A Brasília, Skalee conseguiu recentemente. Ela tem 4 mil quilômetros e estava preservada porque seu proprietário morreu e deixou o carro para seus parentes. “Ficou intocável, sem uso e guardada em uma garagem, por isso está praticamente nova”.
Cada um dos veículos da coleção têm uma história diferente na forma como chegaram até Skalee. O Honda N360 1971, por exemplo, era vendido na Argentina e estava na cidade de Joaçaba quando foi comprado por ele. O carro chama atenção pelo tamanho. É menor que um Fiat 147 e tem motor de 800 cilindradas.
O Unimog alemão, fabricado pela Mercedes Benz é outro exemplo de raridade que chama atenção. Usado principalmente na agricultura e no serviço militar, o carro tinha tomadas de força distribuídas pela carroceria e bomba de água. “Tudo era feito para ajudar o agricultor, no trabalho no campo”, explica ele, que mantém ainda uma paixão pelas motos antigas.
Dentre outras, a coleção tem uma Ariel 1951, de 350 cilindradas funcionando perfeitamente, como se fosse nova. Além dela, uma Sunbean também inglesa de 500 cilindradas, em recuperação. A história da Suzuki 90, que ele conseguiu convencer um farmacêutico a lhe vender, retrata bem o entusiasmo de colecionador.
“Todo dia ele passava com aquela moto e isso me chamou atenção. Até que convenci ele a vendê-la para mim”, lembrava Skalee. Hoje, o antigo proprietário manifesta grande interesse em ter de volta a sua moto, mas o colecionador raramente vende algum dos veículos. Até porque, tem como objetivo preservá-los para as gerações futuras.
“Se ninguém guardar estes veículos, a história se esvai. Então, quando alguém é contaminado pelo vírus da ferrugem, como eu, tem obrigação de guardá-los para o futuro”, diz o colecionador.
Texto e fotos: Jornalista Edelcio Lopes
Edição: Fernando Barenco
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