Versão especial do JK era vendida sob encomenda e somava sofisticação, esportividade e potência extras a um nacional que já era destinado a um público seleto
Em 1960 chegava ao ainda iniciante mercado brasileiro de automóveis, um modelo sofisticado e caro, considerado moderno até para os padrões internacionais. Foi apresentado no dia 21 de abril, feriado de Tiradentes e inauguração as nova Capital Federal. O país era então governado por Juscelino Kubitscheck.
O FNM 2000 JK era a versão brasileira do italiano Alfa Romeo 2000 Berlina
Era a versão brasileira do italiano Alfa Romeo 2000 Berlina, desenhado pelo Estúdio Bertone e lançado em 1958. Lá o modelo não teve o sucesso esperado e saiu de linha três anos depois, com modestas vendas de três mil unidades.
Juscelino e João Goulart
Aqui ele ganhou o nome de FNM 2000 JK — uma homenagem ao Presidente da República. Medindo 4,71 metros e pesando 1.360 quilos, era um sedã familiar de luxo para seis passageiros, mas com ares e performance bastante esportivos. Seu motor 4 cilindros 2.0 tinha carburador de corpo duplo, e válvulas no cabeçote de alumínio. Rendia 108hp. O câmbio era de 5 marchas, numa época em que o padrão geral era os de três marchas, sobretudo aqui no Brasil.
As primeiras cem unidades foram apenas montadas no Brasil. Os carros eram importados da Itália desmontados, num processo conhecido como CKD. Eram exatamente iguais aos que começariam a ser produzidos em seguida no Brasil. A única diferença visual estava no tamanho das garras dos parachoques, que na versão italiana eram menores.
Em 1964 o FNM 2000 teve o ‘JK’ retirado do nome, já que a fabricante era estatal, o país era então governado por militares e eles não eram lá muito fãs do ex-presidente.
No entanto, para um melhor entendimento, vamos continuar o chamando aqui de ‘JK’.
Mas dois anos antes, a Fábrica Nacional de Motores já estudava o lançamento de uma versão especial do 2000. A princípio o carro receberia o nome de “Jango”, em homenagem ao agora presidente João Goulart, que governou o Brasil do final de 1961 — com a renúncia de Jânio Quadros — até o Golpe Militar de 1964.
Ele foi apresentado no III Salão do Automóvel, no finalzinho de 1962, como FNM 2000 Ti (Turismo Internacional). O nome “Jango” acabou não vingando, também por questões político-militares. Mas parece que o próprio João Goulart, ainda na fase de projetos, não gostava muito da ideia de ter um carro com o seu apelido. Foi lançado de fato em meados de 1964. E com outro nome: TIMB, sigla de “Turismo Internacional – Modelo Brasileiro”. Um nacional hoje raríssimo — e já era naquela época — que é o tema desse nosso “Mosca Branca”.
Destaques dos classificados
Mas antes de contar detalhes sobre ele, vamos falar um pouco sobre a sua fabricante, A FNM.
A Fábrica Nacional de Motores
Símbolo de um período de industrialização do Brasil, ao lado de outras estatais como a Companhia Siderúrgica Nacional e a Companhia Vale do Rio Doce, a Fábrica Nacional de Motores teve sua construção iniciada em plena II Guerra Mundial, 1942. Começou suas atividades somente em 1946, montando motores americanos de aviação Wright. Com fim do conflito, a demanda havia diminuído e a empresa com sede em Xerém, na Baixada Fluminense, teve que se adaptar. Inicialmente optou por usar seu enorme parque industrial para fabricar diversos produtos, que incluíam componentes ferroviários, bicicletas, compressores e até refrigeradores domésticos.
Linha de montagem do FNM 2000 JK, em Xerém – RJ
Em 1948 teve início uma nova fase, que é realmente a que nos interessa: a decisão de tornar-se a primeira fábrica brasileira de caminhões. Naquela época as ruas e estradas brasileiras eram dominadas pelos pesados norte-americanos, de marcas como Chevrolet, Leyland, Aclo, GMC… Então a FNM seguiu a tendência natural, tentando parceria comercial com a Mack. Mas o acordo não teve sucesso. Optou-se então pela italiana Isotta Fraschini, famosa por seus automóveis de luxo, mas que também fabricava caminhões na Europa. Pouca gente sabe, mas chegaram a ser produzidos através dessa parceria 200 caminhões D7300 nos anos de 1949 e 50. Infelizmente não se tem notícia de nenhum exemplar sobrevivente. Em 1954 a Isotta Fraschini fechou as portas, dando fim à recente parceria brasileira.
Desfile de lançamento dos hoje possivelmente extintos caminhões FNM/Isotta Fraschini no Rio de Janeiro
Chega então a fase mais conhecida, o acordo comercial com outra italiana, a então estatal Alfa Romeo, também para a produção aqui de seus caminhões. O primeiro modelo foi o D-9500, nascido em 1954. E seu sucessor foi o famoso D-11000, com seus variados padrões de cabines, incluindo a Standard (fabricada pela própria FNM), e de marcas terceirizadas como Brasinca, Carreti, Inca, Metro e Rasera.
Com os negócios indo muito bem para a estatal, no final da década de 1950, o governo brasileiro achou que era o momento de se aventurar também na fabricação de automóveis e acabou optando novamente pela Alfa Romeo e seu recém lançado 2000 Berlina, conforme já contamos aqui.
O FNM 2000 Timb
De perfil e traseira, o Timb era idêntico ao JK, como esse da foto
A proposta da Fábrica Nacional de Motores com o lançamento do Timb era a de reforçar ainda mais a sofisticação e as características esportivas do FNM 2000 JK. Ele era na verdade uma nova versão do mesmo modelo, com outro “sobrenome”, digamos. Era vendido somente sob encomenda e seu valor era bem mais elevado. Era o preço da exclusividade.
FNM 2000 JK e Timb tinham muito mais semelhanças do que diferenças. Aliás, as diferenças estavam somente nos detalhes e os mais desatentos nem mesmo percebiam tratar-se de dois carros distintos. Algo que acontece ainda hoje entre os antigomobilistas.
Propaganda da época
Externamente, vistos de traseira ou de perfil, eram exatamente iguais. Tinham a mesma carroceria sedan de quatro portas com traseira rabo-de-peixe e lanternas verticais. O parachoque traseiro cromado envolvia as caixas de rodas, com escapamento embutido na abertura esquerda, o que dava a ambos um ar extra de esportividade. Nas laterais, frisos cromados em ambas as versões. O FNM 2000 Timb não tinha nenhuma faixa ou outro detalhe esportivo que o distinguisse.
FNM 2000 Timb de perfil
Pneus radiais
Outra grande novidade na época foram os pneus. Radiais Cinturato Pirelli CF67 nas medidas 175-400. Conferiam muito mais estabilidade e eram bem foras do comum naqueles longínquos anos 1960, quando o padrão era o diagonal. O problema é que a medida era em milímetros (equivalia a 15,74 polegadas) e esse detalhe rapidamente se tornou uma grande dor de cabeça para os proprietários dos FNM, já que esses pneus se tornaram muito difíceis de serem encontrados, obrigando a adaptações, como a substituição das rodas originais.
Ambas as versões usavam rodas de ferro ventiladas, com grande calotas cromadas.
Mas e as diferenças?
Nessa foto de época é possivel perceber as diferenças entre o Timb e o JK
Em termos de carroceria, a grande diferença entre o FNM 2000 JK e a versão TIMB estava na dianteira. No JK havia um ressalto que começava no meio do capô e que ia se acentuando até chegar na ponta, onde havia o famoso “cuore” (coração), marca registrada da Alfa Romeo e que no caso dos FNM tinha a logomarca trocada.
No TIMB o capô era completamente liso. Esse detalhe fez com que o “cuore” fosse deslocado para baixo. Por isso o parachoque teve que ser bipartido e ganhar um rebaixo no centro, para a placa não cobrir a parte de baixo do adorno. Esse modelo de capô seria adotado a partir de 1969 no novo FNM 2150.
Além disso, a grade do TIMB não tinha os frisos horizontais e seu parachoque dianteiro não possuía as garras de proteção. Os paralamas dianteiros, os faróis e os faroletes — divididos ao meio com farol de neblina e seta — permaneceram iguais nas duas versões.
Motor apimentado
Além da taxa de compressão aumentada, o FNM 2000 Timb tinha dois carburadores de corpo duplo
JK e TIMB vinham equipados com o mesmo motor Alfa Romeo 2000 de 4 cilindros já descrito aqui. Mas no TIMB ele era “envenenado” com dois carburadores de corpo duplo e taxa de compressão ampliada (8,25:1 contra 7,0:1 no JK), gerando 131hp — 23 a mais que o JK. Potência bem superior a outros nacionais da época. No TIMB o motor era identificado pelo código 200 e no JK, 210.
Interior do FNM 2000 TIMB
A parte interna do TIMB reforçava a sua esportividade. O banco dianteiro inteiriço reclinável do JK deu lugar a bancos individuais em couro, que obviamente também reclinavam. O volante de madeira substituiu o preto. A alavanca de câmbio de cinco marchas foi parar no assoalho. O bonito e completo painel permaneceu igual, com velocímetro horizontal, grande contagiros redondo à direita, odômetro, marcadores de gasolina, óleo e água. Um charme adicional ficava por conta do retrovisor instalado sobre o painel, marca registrada dos modelos FêNêMê 2000.
O FNM 2000 TIMB foi produzido somente até 1968. Não conseguimos apurar a quantidade de carros fabricados nessa exclusivíssima versão. Nem mesmo sabemos se essa informação existe. No entanto, o número total de produção do FNM 2000 — apenas 4.356 unidades, de 1960 a 1968 — dá uma boa noção da extrema raridade do TIMB.
Exemplar pertencente ao Museu do Automóvel de Brasília. Os faróis auxiliares não são originais
Durante esses 16 anos de Maxicar, em nossas andanças por aí, só tivemos a oportunidade de ver de perto dois exemplares. O primeiro um na cor cobre metálica que pertencia à coleção do colecionador Fábio Steinbruch, de São Paulo, que morreu num acidente de motocicleta. O outros, verde metálico, vimos no “Alfa Romeo Brasil”, encontro anual de Alfa Romeos, em Caxambu-MG.
Depois descobrimos que eram na verdade o mesmo carro, o de São Paulo, que havia mudado de cor…
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