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Galaxie – Um Ford com fortes argumentos

Modelo até hoje é lembrado como o ‘top de linha brasileiro’

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Galaxie 1968
[dropcap]E[/dropcap]m meados da década de 1960, nossos carros médios e grandes já acusavam o peso da idade e a importação de carros grandes, principalmente dos Estados Unidos era importante. Nas ruas, o número de Chevrolet Impala, principal concorrente da Ford era grande. Esta empresa de origem norte americana já havia comprado a Willys nacional que produzia o Gordini, o esportivo Interlagos derivado do Alpine Francês, os utilitários Rural, a picape derivada deste, o Jeep e a linha de grandes sedans Aero Willys e Itamaraty.  Ambos eram projetos da década anterior. Produzir aqui um carro moderno e com dimensões generosas seria interessante, pois não havia concorrência interna.

No final de 1967, no Salão do Automóvel de São Paulo era apresentado o Ford Galaxie 500. Era a versão 1965 do modelo americano, maior que os irmãos Fairlane e Falcon e menor que os modelos grandes da linha Mercury e Lincoln. Na década de 1950 a Ford já havia cogitado em trazer o Fairlane e Falcon para cá, desmontados, em modalidade CKD. Os projetos não foram adiante. O Galaxie era um carro bonito, espaçoso para seis ocupantes, linhas muito retas, quatro portas e ótima visibilidade. Tinha 5,33 metros de comprimento, 2,0 metros de largura, 1,46 de altura e 3,032 de entre-eixos. Sua carroceria monobloco era em aço estampado apoiada em chassi perimetral. Pesava cerca de 1.750 quilos. Seus faróis circulares, em número de quatro, ficavam em posição vertical, separados por uma grande grade cromada com frisos retangulares. Logo acima no grande capô as letras FORD separadas e sobre este o mascote logo apelidado de “mira”.

No interior, espaço de sobra
No interior, espaço de sobra

Tinha motor dianteiro refrigerado a água, com oito cilindros em “V”, 272 polegadas cúbicas ou 4.480 cm³ e 164 cavalos a 4.400 rpm, alimentado por um carburador DFV. Era o motor Power King com bloco e cabeçote em ferro fundido. Tinha três marchas à frente, alavanca na coluna de direção e tração traseira. O volante grande com três raios era leve o suficiente para girar com suavidade os pneus na medida 7,77 x 15 com desenho diagonal que poderiam receber faixas brancas. As rodas recebiam belas calotas cônicas em forma de disco. Mas já havia a direção com assistência hidráulica opcional. Seu tanque tinha capacidade para 76 litros, seu consumo médio era de 6,5 km/l e a velocidade máxima era de 165 km/h. Era um dos mais rápidos carros brasileiros, competindo apenas com o Simca GTX  e o FNM 2000.

Era um carro grande, mas compacto para os padrões americanos. Muito confortável, silencioso e com ótimos bancos. Bom para passageiros e motorista. Este não podia ter a intenção esportiva. Não era um carro para correr e sim para desfilar. Seu rodar era muito macio nas ruas ou estradas, principalmente as grandes rodovias que cortavam os estados. Gostava de retas, não de curvas fechadas. A suspensão dianteira era independente com molas helicoidais, barras estabilizadoras e amortecedores de dupla ação. Como é comum nos Estados Unidos, atrás tinha eixo rígido, molas helicoidais, barras estabilizadoras e amortecedores telescópicos também de dupla ação. Na parte interna das portas havia um bom acabamento e duas alavancas: Uma para subir e descer o vidro e outra para controle do retrovisor externo. O descansa braço era de bom tamanho, assim como a luz indicadora de porta aberta. Os pedais tinham ótimo tamanho e eram confortáveis. E o espaço para as pernas tanto para quem dirigia quanto para os passageiros era ótimo. Para destravar o freio de estacionamento havia um pequeno pedal muito prático e moderno. Para travar bastava usar um pequeno botão e dois toques.

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O Galaxie em sua primeira versão brasileira

Em 1968 quase não havia mudanças, mas a nova versão, mais luxuosa LTD era apresentada ao público. O “Limited” tinha teto de vinil de série, pneus faixa branca, grade diferenciada com retângulos menores e emblema de identificação quadrado à direita. Cores exclusivas também estavam disponíveis. Também o ar condicionado especialmente projetado para ele e opcional para o Galaxie. Bancos com novos desenhos e frisos internos nas forrações, aplicação de lâmina de jacarandá nas portas e painel o deixavam diferente do Galaxie. E quem tinha adorava, com muita pompa, dizer as três letras “LTD”! Galaxie não! A Sigla LTD foi usada nos Estados Unidos, na Austrália e no Brasil. O “limited” não tinha a caracterização de uma série especial com um limite de unidades. Apenas um modelo especial mais luxuoso. Lee Iacocca e Henry Ford II sempre acompanharam os projetos e alterações — aprovando ou não — do desenvolvimento do Galaxie no Brasil. Ambos estiveram aqui.

Em 1969 recebia algumas mudanças. Novas cores entravam no catálogo assim como novo acabamento no interior. Novo emblema retangular em posição vertical na grade dianteira que recebia mais um friso e também novo emblema oval na coluna C e mais um friso traseiro na tampa do porta-malas.

O painel continuava retangular com velocímetro graduado até 200 km/h. Havia ainda relógio de horas e marcador de temperatura da água e nível do tanque. Vários botões de controle estavam disponíveis. Era um típico painel americano.  Para as moças e senhoras era bem vindo um espelho no quebra-sol. O enorme porta-malas ganhava forração digna do sedan.

LTD 1970
LTD 1970

Em 1970 recebia na lateral traseira nova grafia na identificação “Galaxie 500” junto com nova luz de direção. O novo motor com 4.786 cm³ (292 polegadas cúbicas) equipava de série o novo LTD e desenvolvia 190 cavalos a 4.400 rpm. Seu torque máximo era de 36,0 mkg.f a 2.200 rpm.  Não o deixavam muito mais veloz. Fazia de 0 a 100 km/h em 18 segundos e sua velocidade final era de 165 km/h. O carro estava mais silencioso e a versão com cambio automático tanto no Galaxie quanto no LTD custava por volta de 10% a mais.

No mesmo ano a Ford decidiu disponibilizar este propulsor para toda a linha. Facilitaria a manutenção também para as concessionárias. A frente do Galaxie mudava pouco, ganhando partes em preto fosco, novos emblemas e frisos. No LTD o mesmo acontecia deixando-o com ares mais sofisticados. Tornava-se o carro de representação de grandes empresários e políticos.  Ao mesmo tempo a empresa estava preocupada com o avanço das vendas do Opala da GM e do Dart da Chrysler. Queria uma fatia maior do mercado e lançou um modelo que se tornou conhecido por “Pé de Camelo”. A exemplo da Simca, VW, DKW e Willys na década de 1960, lançou um modelo desprovido de frisos e com acabamento muito simples. Até uma lâmpada que ficava abaixo do painel foi suprimida. As calotas — apelidadas nos Estados Unidos de “Dog Dish”, ou “bebedouro de cachorro”, devido ao seu formato — cobriam apenas a parte central das rodas e eram pintadas. Por dentro também era fornecido com materiais mais simples e de menor qualidade. Não foram vendidos muitos, não agradaram e hoje são raros.

Entrava 1971 com LTD, 500 e Galaxie como modelos de catálogo. Por fora, o novo LTD Landau havia poucas, mas notáveis novidades. As calotas novas eram americanas e dos modelos que levavam a sigla LTD na marca e dos Lincoln. Na parte debaixo havia um grosso friso de borracha emoldurado por frisos metálicos bem mais elegantes que a grossa parte preta inferior do modelo anterior. Novas cores estavam disponíveis tanto sólidas quanto metálicas. Na coluna C havia um belo adorno, dando um ar de sofisticação, um friso fino com curvas suaves em sentidos opostos inspirado nas carruagens com capotas. Nestas servia de apoio para subir. Para completar a nostalgia, um vidro menor tornando a área do vinil na capota maior. Também novas lanternas traseira e um novo friso. Por dentro novas forrações e desenhos nas portas e nos estofamentos. Outro artefato do passado que enfeitava o Landau era um puxador na porta. O descansa braço era suficiente, mas este tornou o carro ainda mais exclusivo e atraente. As úteis luzes vermelhas na parte inferior da porta, que se acendiam quando abertas, continuavam. E era o automóvel do presidente e por anos ficou como carro oficial da República.

Galaxie 500 1971
Galaxie 500 1971

Em 1972 poucas mudanças externas, mas uma muito importante na mecânica. Os freios a disco passaram a ser servoassistidos com regulagem automática, deixando o carro mais seguro. Muito importante para as temperaturas baixas do sul do país, o carro passou a ter ar quente, mas eram opcionais nos modelos de base.

LTD Landau
LTD Landau

Em 1973 grandes mudanças estéticas no Galaxie 500  e no LTD Landau. No modelo mais simples uma bela grade nova, parecida com os Mercury por conta do ressalto central, toda cromada e novo capô também com ressaltos.

No LTD esta era dividida, havia apenas uma grade central retangular e placas metálicas com um farol auxiliar retangular no meio. Em ambos havia nova lanterna traseira, menor, mas mais moderna e bonita. Abaixo nova faixa metálica em alumínio com desenho simples no Galaxie e frisos horizontais no LTD. A nova versão LTD Landau deixava os donos ainda mais orgulhosos. Tenho um Landau!

Em 1974 e 1975 a linha não apresentou muitas diferenças, mas a Ford tinha bons planos para 1976.

A nova linha Galaxie 1976. A partir do alto: Galaxie 500, LTD e Landau
A nova linha Galaxie 1976. A partir do alto: Galaxie 500, LTD e Landau

Grandes novidades e novas atrações para os fiéis da marca. Por baixo estava o robusto e moderno motor 302 V8 usado em nosso Ford Maverick, mas também no Ford Mustang, no Thunderbird, na linha Lincoln e em vários da linha Mercury. Era fabricado no México e no Canadá. Outra boa novidade eram os pneus radiais na medida 215/70 HR 15 com pneus faixa branca. No Galaxie continuavam a ser diagonais na medida 8,25 x 15.

Não trazia grandes alterações no desempenho,  mas era mais adequado ao  carro.  Para atrapalhar a vida do Ford chegava o Alfa Romeo 2300 em 1974 e tanto a GM com o Opala Gran Luxo quanto a Chrysler com o Dodge Gran Sedan estavam se sofisticando.

Por fora uma bela mudança radical. Os faróis passavam a ficar em posição horizontal e continuavam com formato circular. Tanto no Galaxie quanto no LTD e no Landau as grades haviam mudado. No Galaxie 500 continuava bonita, simples,  limpa e com frisos horizontais cromados. O carro estava com mais presença.

No LTD e no Landau a grade era menor, frisos verticais, também cromados e faróis inseridos numa placa em aço estampado. Atrás todos os modelos ganhavam novas lanternas em formato horizontal, retangulares, em numero de três.

No painel novo volante e poucas mudanças notáveis. Já utilizava vidros com acionamento elétrico. E o vidro traseiro estava com o tamanho antigo, original.

Em 1979, para comemorar os 60 anos da Ford no Brasil, foram produzidas 600 unidades do Ford Landau série especial. Todas na mesma cor, Bordeaux, e o acabamento interno e externo era exclusivo.

Propaganda do Landau 1980 motivo a álcool
Propaganda do Landau 1980 motivo a álcool

Neste mesmo ano a linha Galaxie foi extinta. Era um sinal que o automóvel ia deixar de ser produzido. Em 1980 o Landau era fornecido com o primeiro motor V8 movido a álcool no mundo.  Havia ganhado aperfeiçoamentos importantes como duplo cano de descarga deixando-o ainda mais silencioso; um carburador duplo, tornando-o mais econômico; e a suspensão recalibrada, que fazia com que se tornasse mais estável. Também um novo radiador com maior capacidade, deixando o motor com uma temperatura mais adequada, já que o V8 tinha tendências a superaquecimento. Por conta da lei de fechamento dos postos de gasolina às 20:00 horas e fins de semana visando economia de combustível, a medida esdrúxula do governo fez com que vários fabricantes aumentassem a capacidade do tanque de combustível. No caso do Ford o tanque passava de 67 para 107 litros. Pouco adiantava, pois a venda de galões de plástico ou metal subiram. Teve até gente que colocava dois tanques nos carros!

Também novos tecidos, deixando o assento e o encosto menos escorregadio. Era um problema crônico que a Ford nunca havia dado muita atenção, mas irritava os motoristas.

O Galaxie deixou as linhas de montagem em 1983, após 16 anos, totalizando 77.850 unidades produzidas. Foi um carro que deixou muitas saudades e até hoje felizmente são conservados com muito carinho.

 

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Nas Pistas

O 1965 de A.J. Foyt ficou tão famoso que virou miniatura
O 1965 de A.J. Foyt ficou tão famoso que virou miniatura

Aqui no Brasil correu na categoria T5000, carros com cilindrada perto ou acima de 5.000 cm³ junto com o Maverick e o Dart. Tinha poucas unidades na largada, a maioria dos pilotos preferia os outros citados. Um deles, o mais destacável, tinha frente bem modificada, aerodinâmica e carroceria com algumas alterações, era muito interessante. Se fosse o cupê…

Nos Estados Unidos corriam em ovais, pistas rápidas e inclinadas com curvas muito abertas como Riverside, Daytona, Indianápolis, Talladega, chegando perto dos 310 km/h. Eram corridas muito emocionantes, milhares de expectadores e telespectadores durante o ano, muitos patrocinadores, um colorido muito bonito.

Chegaram a ser transmitidas aqui no Brasil numa época em que só tinha canais abertos. Garantia de divertimento. Pilotos como A. J. Foyt (pilotando um Galaxie), Dan Gurney e Richard Petty, um de seus concorrentes eram presenças constantes.

Eram carros protegidos por gaiolas bem construídas, robustas, portas soldadas, interior com o mínimo necessário e peças de fibra como capô e tampa do porta-malas. A potência em cavalos estava por volta dos 600 e cilindrada em torno dos 7.000 cm³. Não tinham condições de correr em pistas com muitas curvas para despejar toda a potência nem competir na categoria GT ou protótipos em provas de longa duração de 12 ou 24 horas. Mas eram fortes e muito velozes!

O cupê 7 Litre

O poderoso 7 Litre
O poderoso 7 Litre

Em 1966 este Galaxie mais potente estava enquadrado na categoria “Full Size Sedans” e competia com o Chevrolet Caprice, o Chrysler 300, o Pontiac Grand-Prix, o Dodge Polara americano, o Mercury Montclair e o Rambler Ambassador. Unia conforto, luxo e muita potência fazendo de 0 a 100 km/h em 8,5 segundos e chegando a final de 210 km/h. Tinha 428 polegadas cúbicas, 345 cavalos a 4.600 rpm, taxa de compressão de 10,5:1 e torque de 63,0 mkg.f. Era um modelo especial com quatro freios a discos e o preferido de quase todos os pilotos da Nascar. Não era um carro, se fosse aproveitar da usina, para amadores.

Concorde: fora de série com mecânica Galaxie
Concorde: fora de série com mecânica Galaxie

O Concorde

O Concorde era uma réplica brasileira fabricada pela empresa de João Storani, a Concorde Indústria de Automóveis Especiais  que utilizava o chassi e motor do grande Ford Nacional.

O Número 500

Este número foi utilizado para identificar carrocerias, cores, datas, chassis, etc. Mas não deixa de referenciar as 500 Milhas de Daytona, Talladega, Indianápolis…. Identificou também os Mustang Shelby e os Fairlane.

Motores

Em 1965, nos Estados Unidos, o motor básico do Galaxie 500 começava com seis cilindros em linha, 3.933 cm³ e 157 cavalos. Depois vinham sete motores de oito cilindros em “V”. O mais manso com cilindrada de 4.736 cm³ e 203 cavalos. Depois vinha um com 5.768 cm³ e 254 cavalos. Começava a subir para 6.391 cm³ e 269 cavalos. Outro com a mesma cilindrada e 319 cavalos. Este chegava fácil aos 190 km/h. Pulava para 7.014 cm³ e 350 cavalos. Terminava com mais dois ferozes com 6.997 cm³ e 415 cavalos e o mais apimentado terminava com 431 cavalos. Neste o torque era de 66,2 mkg.f e chegava aos 220 km/h. Bom para impulsionar o conversível de 1.822 quilos. Estes mais bravos tinham um carburador Holley com corpo quádruplo em posição invertida. Um desses de maior cilindrada e potência poderia ter vindo para cá. Mais adequado ao peso do grande sedan.

 

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Francis Castaings

É Analista de Sistemas por profissão e antigomobilista por muita paixão. Frequenta museus, lojas, salões, exposições, corridas e encontros de carros, antigos ou não, desde 1970. Gosta mesmo dos antigos e o apreço também veio por causa de sua coleção de miniaturas de carros em escalas que variam de 1/76 a 1/18 e que conta até o momento com cerca de 1.500 modelos. Nasceu em 5 de junho de 1959, já fez rali, foi Técnico Superior de Fundição, trabalhando numa fundição de peças para automóveis. Escreveu por 12 anos sobre carros antigos em outros portais e desde julho de 2011 mantém o site Retroauto.

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