O calor se propagando do homem, pai, para o metal “frio” dos carros antigos
*Henrique Moraes
[dropcap]Q[/dropcap]ual o motivo de sermos antigomobilistas?
Fui convidado para escrever algo sobre antigomobilismo neste nobre espaço e confesso, neste momento, que além da honra e responsabilidade, continuarei na linha que sempre trilhei nos meus humildes textos, ou seja, aproveitando de forma contumaz a oportunidade para falar um pouco do que considero ser mais importante no meio dos carros antigos. Não sou muito técnico sobre carros e acho que os homens sempre serão mais importantes do que o metal. O metal compramos. A história fazemos.
Deixei a pergunta no primeiro parágrafo, com o intuito de fazer o nobre leitor refletir, mas de forma egoísta, ”coloquei a escada” para enredar o meu texto.
As respostas são muitas, pois cada pessoa tem o seu motivo, a sua inspiração. Alguns, respondendo com sinceridade dirão: vaidade. Eu não aceito, pois esta pessoa não é antigomobilista, simplesmente está infiltrada no meio, estragando e desvirtuando a história. Esta é a verdade. Desculpem-me!
No início da rua onde morávamos existia uma curva e muitas foram as vezes em que eu calejava meus cotovelos, apoiados sobre o peitoril da janela, no segundo andar, esperando apontar a frente do carro do meu pai, ou melhor, do super-herói.
A minha resposta, inspiração deste texto é a seguinte: estou neste meio por causa do meu pai. Acham que ele me presenteou com um carro antigo? Não. Acham que ele me levou para este meio, pois já participava? Também não. Estou neste meio por QUERER ser meu pai. Exatamente! Quando era criança achava que meu pai era um super-herói. E o meu super-herói chegava de carro, geralmente Variant, TL, Fusca e, na maioria das vezes, Passat.
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No início da rua onde morávamos existia uma curva e muitas foram as vezes em que eu calejava meus cotovelos, apoiados sobre o peitoril da janela, no segundo andar, esperando apontar a frente do carro do meu pai, ou melhor, do super-herói. Alguns carros nós — eu e meu irmão — reconhecíamos antes de visualizá-los, simplesmente pelo barulho. Aquela era a época em que carros esportivos tinham “kadron”, rodas de magnésio, faixas pretas, volantes “fórmula 1” e retrovisores esportivos. Quando ele parava em frente ao portão perguntávamos: “Podemos dirigir?” Dirigir era sentar no seu colo e apenas passar a marcha e virar o volante. Os pedais eram com ele. Ah! Cada dia um dirigia. Achava que meu pai era lindo e imbatível. “Passa ele pai!” Assim dizíamos sentados no banco de trás. Meus carrinhos, brinquedos inseparáveis, tinham o mesmo barulho dos carros do meu pai. Os barulhos, lógico, eram feitos arranhando minha garganta. Já tentaram fazer o barulho esportivo de um carro no “gogó”?
Eu sonhava ser igualzinho ao meu pai. Eu amava os carros que meu pai tinha. Passat era o preferido. Mas ter o carro que meu pai tinha era complicado, pois poder dirigir demandava, cerca de dez anos e, evidentemente, a dificuldade de possuir carros. Então, o sonho de ter aqueles carros se uniu à realidade e, sinceramente, me levou ao antigomobilismo.
Hoje eu tenho o tal Passat, na realidade, até mais de um, e graças a Deus, não deixei o monstro da vaidade me pegar, pois até o presente momento, não consegui ser igual ao meu pai. Então, me satisfaço em ser apenas um bom pai, longe de ser um super-herói, pois o meu super-herói existe, mas é único, imbatível, felizmente palpável. Aonde virem um super-homem dirigindo um Passat, verão meu pai, Sr. Waldir e, sendo assim, olhem ao lado e me verão, tentando, sem sucesso, ser meu pai.
Antigomobilismo, maneira simples de colocar nossos carros antigos a serviço da emoção, história, amizade, companheirismo, boa vontade, respeito e família.
Aproveite este momento, para homenagear o seu super-herói, seu pai. Quem sabe se amanhã você também será homenageado. Abrace seu pai. Caso não possa, pense nele. Pense naqueles pequenos momentos em que voar com ele era sentar no seu colo e dirigir. O gostoso não era apenas dirigir, mas sim estar ali.
Um dia destes, estávamos indo para uma exposição em Juiz de Fora e pegamos a BR-040, dia lindo de sol, estrada maravilhosa. Quando chegamos ao destino encontramos alguns amigos de Paraíba do Sul. Disseram que estavam parados no cruzamento da estrada e viram o primeiro Passat passar, logo em seguida, viram o segundo e pensaram: “Lá se vão pai e filho de Teresópolis.” Eles não sabiam, mas eu tentava andar na frente do super-herói, que hoje até me deixa ser a locomotiva. Eu prefiro achar que sou um “batedor”, pois a vaidade sempre dará lugar à realidade.
Esta é a minha resposta, mas não é a única. Cada antigomobilista de verdade tem a sua. Responda. De qualquer forma, viva os carros antigos, metais frios que se tornam ferventes, perante os olhos dos emotivos, que nos dão oportunidade de fazermos nossas histórias e revelarmos nossos sentimentos. Carro antigo é sentimento, uma simples ponte que nos liga ao passado e muito nos alegra o presente.
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*Henrique Moraes é empresário da construção civil e um antigomobilista apaixonado pelos Passats. Vive em Teresópolis, RJ
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